domingo, 18 de setembro de 2011

QUASE LEVE: Danilo Gentili divide-se o 'CQC' e o 'Agora é Tarde'


O tom de voz baixo e a cara de bom moço dão um ar retraído a Danilo Gentili. No entanto, em pouco tempo de entrevista, fica evidente que sua fluência é proporcional aos seus 1, 92 m de altura. "Falo de tudo. Principalmente mal de mim mesmo. Mas os jornalistas insistem em publicar apenas as observações que faço dos outros", analisa. Mesmo fazendo piada sobre tudo e todos, é perceptível que o humor de Danilo ganhou certa ponderação. O que fica aparente quando vem à tona a principal característica do Agora é Tarde, programa de entrevistas que ele comanda desde junho. "O programa não quer contestar nada. Quer apenas fazer as pessoas rirem antes de dormir", ressalta. De acordo com o comediante, só agora os telespectadores poderão ter noção de como ele é na realidade, longe das pautas polêmicas do CQC, programa no qual estreou em 2008.

Ao lado de Marcelo Tas, Marco Luque, Rafinha Bastos, Rafael Cortez, Felipe Andreoli, Oscar Filho e Mônica Iozzi, Danilo passou por Brasília e chegou até a ser agredido em algumas reportagens. Atualmente, ele se divide entre o humor contestador do programa exibido às segundas, e a despretensão do "late night" que vai ao ar nas noites de terça, quarta e quinta. "Posso exercitar porções diferentes do meu humor. Ter um programa não me fez querer sair de outro", conta o apresentador, natural de Santo André, no ABC paulista.

P - Você é o terceiro integrante do CQC a comandar um novo programa dentro da emissora. O humorístico não é o bastante?

R - O CQC é um programa consagrado, já existe há quatro anos e é uma das maiores audiências da Band. É claro que é maravilhoso fazer parte daquela equipe. Mas todos lá estão se adequando ao modelo do programa. Temos voz ativa, mas somos apenas repórteres. Quase pirei quando a emissora sinalizou a possibilidade de que eu iria ancorar um programa de entrevistas. Porque é a minha chance de mostrar meu outro lado. Algo mais pessoal e diferente do que faço no outro programa.

P - Que outro lado é esse?

R - É um lado que não está na minha porção repórter do CQC, que só quem vai nos meus shows conhece. São coisas bem diferentes, aqui e nos bares eu posso falar meus palavrões e as bobagens do cotidiano. No CQC eu tenho de ser crítico e incisivo.

P - Você não tem receio de que possa surgir alguma coincidência de conteúdo entre as duas produções?

R - Não existe possibilidade de confusão e mistura de formatos. O CQC é um programa que tem o objetivo de fazer as pessoas pensarem, enquanto o Agora é Tarde é um "late night", um programa noturno feito para o cara que chega cansado do trabalho, que quer só sentar no sofá, olhar a tevê, pôr o cérebro no cabide e se divertir. A gente quer entreter, mas também quer sentir prazer em fazer aquilo.

P - Por conta dos compromissos com o Agora é Tarde, quanto da sua participação no CQC foi reduzida?

R - Vou dar uma diminuída nas reportagens em Brasília. Isso já vem acontecendo tem um tempo. Não sou uma pessoa muito querida no Planalto. Acho que a Monica sabe conduzir muito bem as pautas políticas que são feitas lá. Mas eu continuo normal no CQC. Como estamos implementando o novo programa, a equipe está sendo bem compreensiva comigo. Não me mandam para viagens longas, mas toda segunda estou lá com uma ou duas matérias. É meu desejo continuar no programa, eu adoro fazer aquelas reportagens. É a minha origem na televisão. Tudo o que sou eu devo ao CQC.

P - Estar em dois programas significa que seu salário também dobrou?

R - Quem me dera! Para fazer o novo programa eu ganho menos do que no CQC. Isso porque ainda não sabemos se o programa vai ter uma vida maior. Se continuar, vamos ver se eu consigo ganhar um pouco mais, né? Fica a dica para o setor financeiro da emissora (risos).

P - Seu programa solo é uma das maiores audiências da programação da Band. Acha que esse desempenho pode gerar alguma crise de ego ou ciúmes entre seus companheiros do CQC?

R - Não. Eles até estão pedindo para serem entrevistados. Cada um tem uma linha e se dá bem com o que sabe fazer. Não acredito que outra pessoa do CQC se interessasse em fazer um programa de entrevistas. O Felipe Andreoli, por exemplo, é louco para fazer um programa de esportes. Então não tem muitos conflitos, nem ciúmes, pois não é o tipo de projeto que eles também gostariam de estar.

P - Por conta de algumas piadas feitas na tevê e, principalmente, na internet, você já teve problemas com a Justiça e com instituições que defendem os direitos civis. Acha que existe uma patrulha do politicamente correto? Como você lida com isso?

R - Ao contrário do que possa parecer, lido muito bem. O humor no Brasil é algo muito preso e censurado. Não quero ofender ninguém, sou apenas um comediante. Acordo todos os dias querendo fazer as pessoas darem risada. Se, em algum momento, elas não acham graça, peço desculpas e tento de novo fazer algo engraçado. É isso que eu tento fazer. Se algumas dão erradas, vou tentar fazer outras piadas darem certo.

P - O humor de suas perguntas no Agora é Tarde é bem menos ácido do que o usado nas reportagens do CQC. Essa pegada mais leve é para não assustar os convidados?

R - Miro meu humor nos alvos necessários. Estreei na televisão com o repórter inexperiente, mirava meu humor exatamente no lado oposto da acidez. Minha fama de ácido veio justamente pelo tempo em que passei em Brasília. Aquelas perguntas e aquela ironia são essenciais ali. É o que o programa pede. Seja eu, Mônica ou quem for, é preciso ser incisivo e fazer perguntas diretas. Sou fã de vários tipos de humor e procuro usá-los onde eles podem caber. No começo era algo inocente e bobo. Quando fui cobrir a área política foi necessário esse outro tom. No Agora é Tarde, pela descontração do programa, o clima é de camarim, eu e meus amigos falando bobagens. Nós não queremos influenciar, nem ouvir coisas intelectuais, queremos é dar risadas. E ainda temos a liberdade que o horário de exibição nos proporciona.

P - Além da liberdade de falar o que quiser no horário, até onde vai a sua autonomia dentro das abordagens do programa?

R - Não houve conversas sobre isso com a direção da Band, o que me permite dizer que tenho total liberdade de conteúdo. Não existe nenhuma ordem de ser mais ou menos ácido. É um programa de descontração, que não precisa de polêmicas. Além de fazer as entrevistas, também sou um dos redatores, o que me faz identificar muito com ele. Participo de tudo, da criação das piadas à escolha dos convidados.

P - E qual o seu critério para a seleção de entrevistados?

R - Um programa de entrevista noturno que se preze deve convidar para o mesmo sofá um padre e um ator pornô. O gênero pede que os convidados da semana formem um contraponto. Desde um político ilustre, a um ator decadente que ninguém se lembra mais, mas que ainda tem algo para mostrar. Um "late night" pede isso. A mistura está boa até aqui. Eu estou muito feliz com o resultado.

P - Tem alguém em especial que você gostaria de levar ao programa?

R - Tem sim. Adoraria entrevistar o ex-presidente Lula. Minha lista é grande, não falo outros nomes para não atrapalhar a negociação. Não importa muito se o convidado é de outra emissora. O trâmite é o mesmo de quando vou a outros canais. É algo que não depende muito de mim, mas dos departamentos artísticos. Atualmente, acho que as emissoras estão cedendo seus contratados de forma mais tranquila. Antes, artistas da Globo não apareciam em lugar algum. Isso mudou um pouco depois do Pânico na TV e do CQC. Essa parceria só enriquece a programação da televisão.

P - Sente medo de comparações com o Programa do Jô, principal "late night" da televisão aberta brasileira?

R - Não, pois são propostas diferentes. Acompanho o trabalho de todos os caras que apresentam esse tipo de programa, tanto os nacionais quanto os americanos. É claro que vão comparar, mas depois de assistir atentamente, vão ver as diferenças básicas. Ao contrário do Bira com o Jô Soares, o Roger não ri de nada que eu falo (risos). Adoro o trabalho de vários comediantes e não me deixo influenciar por eles, vai ser assim com os entrevistadores também. É preciso ser o mais autêntico possível. Por mais que eu seja fã do Jimmy Fallon, do David Lettermann, se eu tentar copiá-los, não vai dar certo. Ao longo do tempo, o programa vai absorvendo a personalidade do apresentador. Essa ligação não é do nada.

Reportagem de Geraldo Bessa - TV Press

Fonte: Jornal Cruzeiro do Sul

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