sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Caso Rafinha: Em entrevista exclusiva ao BN, Tas chama veículos de hipócritas: 'Todos têm limites'


Marcelo Tristão Athayde de Souza, o Marcelo Tas, é engenheiro civil de formação, mas passou a atuar na TV em 1983, ano da sua graduação na Universidade de São Paulo (USP), quer seja como repórter, apresentador, ator, diretor ou roteirista de vários programas de diversas emissoras. Também escreveu para jornais, trabalhou no rádio e mantém, até hoje, o Blog do Tas.

O paulistano, torcedor do Santos Futebol Clube, aos 51 anos, vive o auge da sua carreira com o “Custe o que Custar”, o CQC, veiculado às noites de segunda-feira na Band. Nesta entrevista exclusiva ao Bahia Notícias, após a sua participação no seminário “A Sociedade em Rede e a Comunicação”, promovido pela Telefonica/Vivo, na capital paulista, Tas falou de jornalismo, da fórmula de sucesso do CQC e sobre a polêmica demissão do companheiro de bancada Rafael Bastos, após dizer que “comeria ela e o bebê”, ao falar sobre a gravidez da cantora Wanessa Camargo.

Para ele, o debate do episódio revelou uma hipocrisia da imprensa. “Todos os veículos que discutiram o caso do Rafinha não foram honestos com seus leitores, com seus ouvintes, porque omitiram que todos os veículos têm limites. É muita covardia isso, né? É apostar na burrice do seu ouvinte, do seu leitor”, disparou.

Bahia Notícias – Durante o seminário “A Sociedade em Rede e a Comunicação”, promovido pela Telefonica/Vivo, em São Paulo, a maior polêmica foi referente à questão do cidadão que se tornou comunicador. Mas você trouxe outro aspecto importante, que foi o fato de a humanidade ter passado a ler e escrever mais do que em qualquer outra era. O jornalismo está diante de um novo público e de uma nova linguagem?

Marcelo Tas – Nós já estamos formando novos leitores o tempo todo. E o que é legal de ver é quem são essas pessoas, no que é que elas estão interessadas... A gente vê, por exemplo, a proliferação de interesse em Idade Média, vampiros, ‘cê entendeu? O que é que é isso? Será que é o Harry Potter? Será que é o Senhor dos Anéis? Eu acho que é muito interessante a gente entender e não deixar superficial essa discussão. Para mim, ele [público] vai sempre na história que está sendo contada, independentemente de a gente estar usando mais computador ou não, ou os tablets, ou Twitter, ou Facebook. É algo que atraiu as pessoas em uma dimensão mais profunda, na direção de conhecer a vida de um bruxinho e de passar anos da sua infância e adolescência mergulhadas em games que falam desse assunto. Eu conheço crianças, por exemplo, que sabem mais sobre espadas do que muitos especialistas. Sabe que esta espada é da Idade Média, esta outra é da Renascença, e isso para mim é conteúdo. Essas pessoas estão tendo acesso a conteúdos que estão tocando a vida delas. Então, é mais uma questão de exercitar uma clareza e um não-preconceito a tudo isso para poder participar da brincadeira, para participar desta grande transformação.

BN – Você falou também sobre a relação entre jornalismo e humor e disse concordar que não deve haver essa mistura, mas o CQC faz isso. Não há uma contradição?

MT – Eu falei isso para evitar concorrentes (risos).

BN – Mas você não acha que é perigoso?

MT – Evidentemente que eu acho essa mistura extremamente eficiente. Essa é a chave do CQC e esse é o contexto de onde eu disse essa frase: são duas coisas que não se deve misturar, mas a gente mistura, porque a gente acredita que, desta mistura impossível, a gente consegue trafegar informações jornalísticas que chegam a pessoas que já tinham se desinteressado pelo jornalismo. Eu tenho catalogados muitos desses novos telespectadores do CQC, que falam assim: ‘Tas, eu já não lia jornal, já não acompanhava noticiário político e, por causa do CQC, eu voltei a ler jornal, ouvir rádio e me interessar pelo noticiário político’. Ou seja, o programa tocou em um cara que não aceitava mais aquele tipo de jornalismo que o tratava, sei lá, em alguns casos, como um desinformado, que excluía o jovem desse debate político. O CQC, com o humor, atraiu um monte de jovens para o debate político. Eu acho isso muito positivo e acho que todo jornalista deve estar atento a isso. Não estou dizendo que esta é uma receita para todo o tipo de jornalismo ou todo o tipo de jornalista, até porque fazer humor é muito difícil. Mas o humor facilita ou torna mais eficiente a comunicação, quando você acerta na dose.

BN – Exato. E como fazer para não perder a mão nessa dose?

MT – Aí é um segredo de um milhão de dólares (risos). Basta você ver quem ganha melhor. Nas televisões isso é muito claro. Fazer humor é tão difícil que geralmente são os salários mais altos de toda a emissora. Você pega a Globo, Faustão, Jô; lá na Band, graças a Deus, o CQC é um programa com grande prestígio comercial também. Enfim, o humor é algo muito difícil. É algo que não se faz nas horas vagas. O CQC tem uma equipe de 40 pessoas em que a gente pode colocar, pelo menos, 15 jornalistas e, talvez, outro número igual de humoristas, e a gente leva os dois a sério. Você tem que fazer bem o jornalismo, mas você tem que fazer bem o humor. Às vezes, a gente vê no jornalismo muito uso amador do humor. Uma gracinha para terminar o jornal e tal, e não é por aí.

BN – Vou fazer uma pergunta meio CQC para você.

MT – Manda bala.

BN – O nome do programa é ‘Custe o que Custar’. Você não acha que perdeu o sentido depois que Rafinha Bastos saiu por ter perdido a mão?

MT – (breve silêncio) Por que? Por que teria perdido?

BN – Pela piada ‘como ela e o bebê’. Não teria sido uma dose excessiva desse humor?

MT – Não. Eu acho que esse episódio, para mim, é muito claro. É uma piada que não teve muita graça, você entendeu? Tanto que ela desaguou mais em debates entre os jornalistas do que pessoas rindo (risos). Você entendeu? É muito simples assim. A função do humor, quando ele não gera graça e gera mais ‘mi, mi, mi’ na internet...

BN – ...constrangimento?

MT – Não é constrangimento. Porque para um humorista, e até para ele próprio, não tem grandes problemas. Mas para muita gente isso virou um assunto, para nós, completamente superado. Tem gente que adora estender esse assunto. Para mim é um assunto muito simples: piada é uma coisa que você ri ou não ri. É na hora. Essa não foi uma piada feliz e acabou. Piada que não tem graça acaba ali.

BN – Então, ‘Custe o que Custar’ mantém o sentido?

MT – Totalmente. O CQC é um programa que fala coisas que a maioria dos veículos não tem coragem. No último, por exemplo, a gente mostrou a barbaridade deste ano no Congresso Nacional de uma maneira muito veemente, como pouca gente faz. Eu acho isso uma qualidade do programa e, aparentemente, eu não entendo porque que outras pessoas não fazem, mas a gente faz. A gente bota a Jaqueline Roriz [deputada do PMN-DF, filmada a receber dinheiro do chamado mensalão do DEM de Brasília] na parede e ela sente. Ela acusa isso. A gente foi ao Amapá e mostrou uma situação totalmente insustentável [aumento da verba indenizatória da Assembleia Legislativa de cerca de R$ 30 mil para R$ 100 mil]. Então, assim, o programa procura avançar nos limites que todos nós temos. Todos os veículos têm limites. Essa é outra hipocrisia que nessa discussão do Rafinha ficou muito escondida. Todos os veículos que discutiram o caso do Rafinha não foram honestos com seus leitores, com seus ouvintes, porque omitiram que todos os veículos têm limites. É muita covardia isso, né? É apostar na burrice do seu ouvinte, do seu leitor. A gente não aposta nessa burrice. A gente leva porrada, a gente está acostumado a levar porrada, justamente porque a gente se deixa...

BN – Botar a cara para bater?

MT – ...botar a cara para bater e para apanhar também (risos). A gente não foge da briga e, por isso, para mim, o lema ‘Custe o que Custar’ está absolutamente vivo.

BN – No evento, você disse ser um otimista. Dá para ser otimista com esse número excessivo de casos de corrupção que a gente vê no Brasil?

MT – Olha, dá se você entender que o número de casos de corrupção é diretamente proporcional a mais transparência. Então, mesmo que o cara queira esconder, ele não consegue esconder. No caso da Jaqueline Roriz, para ficar em um caso mais emblemático, é pura transparência. Uma câmera filmando ela botando a mão no dinheiro... É uma imagem que a gente não via antes. Não é que não acontecia antes, não é que aumentou a corrupção. É que agora a gente vê. Então eu acho que, até isso, dá para a gente ter um olhar positivo. Eu não diria que o olhar otimista é um olhar ingênuo, mas é que é legal a gente ver que existe a Jaqueline Roriz, que é uma moça que põe a mão em dinheiro que não é dela e fica exposta. Se o público quiser elegê-la, aí já é um problema dos cidadãos que a elegem e a elegeram. Mas aí é um problema de educação pública, não é um problema mais de esconder as coisas. E aí é outra coisa que a gente precisa assumir no Brasil também: a responsabilidade individual. Nós somos responsáveis pela corrupção. Nós também somos corruptos. A gente corrompe e guarda, a gente joga lixo onde não deve, a gente faz ligação clandestina de internet, de televisão, entendeu? Isso é algo que a gente tem que se ver também como participante dessa corrupção e procurar mudar de vida.

Fonte: Bahia Notícias - Matéria de Evilásio Junior

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