A eleição de 2010 está menos engraçada. A criação de restrições que impedem que os candidatos aos cargos eletivos sejam satirizados pelos programas humorísticos foi o tema de uma entrevista exclusiva do jornalista e humorista Marcelo Tas, apresentador do CQC ao Congresso em Foco. Por conta das restrições, situações que eram comuns no CQC, quando pessoas que passavam por situações mais constrangedoras eram atingidas por marretas ou tinham o nariz aumentado por meio de trucagens com desenho animado, não podem acontecer com os candidatos. Na entrevista, Tas, que chegou a perguntar ao então candidato à Presidência da ditadura militar, Paulo Maluf, se era verdade que ele era corrupto, mostra-se indignado. Avisa: “Não vão me intimidar”. Mas, resignado, reconhece: terá que respeitar a lei.
O fato é que, gostem ou não, as emissoras de televisão passaram a ficar com a atenção redobrada após o início do período eleitoral. Desde o dia primeiro de julho, elas estão na mira da legislação eleitoral (9.504/97). E a norma diz que os candidatos não podem ser submetidos a trucagens ou montagens que tenham tom de deboche e os coloquem em situações constrangedoras ou ridículas. A regra não poderia ser mais clara: é proibido fazer piada com eles. Por conta disso, o CQC parou de fazer suas trucagens com desenho animado. E o Casseta & Planeta Urgente!, da TV Globo, simplesmente aboliu do programa qualquer referência aos presidenciáveis e outros candidatos nestas eleições. Os humoristas cogitam até mesmo fazer uma passeata no Rio de Janeiro para protestar contra a situação.
Não se deve, porém, debitar o rigor contra os programas humorísticos à Justiça Eleitoral. O Congresso em Foco refez o caminho que estabeleceu a regra. Ela foi incluída pelo Congresso Nacional, mais especificamente pela Câmara dos Deputados, quando foi discutida, em setembro do ano passado, a minirreforma eleitoral. O texto encaminhado pelos deputados e senadores ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) preocupou-se, entre as alterações, em ampliar as restrições ao humor e mais do que isso: proibir a ridicularização contra candidatos, partidos e coligações.
Desde 1997, já havia uma norma que vedava o uso dos recursos audiovisuais que pudessem causar prejuízos aos candidatos. Entretanto, não detalhava quais os recursos que seriam proibidos, nem de que forma eles seriam vedados. O texto aprovado na minirreforma, assim, passou a descrever de forma detalhada todas as restrições, além de definir o entendimento do que era trucagem e montagem no audiovisual. Dessa forma, o que até então era uma norma sem aplicação virou uma rigorosa restrição à sátira política. Se a lei já previa limitações, com o novo texto, o risco de transgredir a regra passou a ser pesado pelas emissoras de TV. Quem desrespeitar as vedações que lhes são impostas desde o dia 1º de julho, até o fim das eleições, fica sujeito à multa entre R$ 20 mil a R$ 100 mil, duplicada em caso de reincidência.
Lacunas preenchidas
Relator da minirreforma na Câmara, o deputado Flávio Dino (PCdoB-MA) foi quem apresentou o substitutivo (veja o documento) ampliando as restrições. O artigo 45 da Lei teve dois parágrafos acrescidos. Pela redação, passou a ficar definida como montagem “toda e qualquer junção de registros de áudio ou vídeo que degradar ou ridicularizar candidato, partido político ou coligação, ou que desvirtuar a realidade e beneficiar ou prejudicar qualquer candidato, partido político ou coligação”.
Procurado pela reportagem, o parlamentar, que atualmente concorre ao governo do Maranhão, rebateu as críticas que ganharam forças após o início do calendário eleitoral. Dino rejeita veementemente que sua intenção tenha sido de preservar os políticos nos programas humorísticos. “Essa lei já existia há 13 anos. Eu apenas preenchi as lacunas existentes, pois não se definia o que é trucagem e montagem. Ou seja, fiz melhorar a lei. Agora, dizer que eu endureci a Lei para preservar os políticos é uma afronta”, argumenta Dino.
Na verdade, havia dois propósitos. Primeiro, impedir montagens e trucagens na internet nas quais os candidatos aparecessem em situações que os ridicularizassem ou gerassem forte prejuízo. Como diabo ou Drácula, por exemplo. Segundo, evitar que a guerra entre os candidatos ganhasse contornos muito fortes em localidades em que um político tem uma emissora de rádio e TV e pode usá-la para ofender seu adversário. O problema é que a norma, muito restritiva, tolheu os programas humorísticos.
O substitutivo de Flávio Dino foi um complemento a uma proposta originalmente apresentada pela deputada Manuela D'Àvila (PCdoB-RS). A emenda da parlamentar previa limites para a cobertura eleitoral, mas apenas na internet. Pelo texto, a deputada sugeria que ficasse “vedada a utilização e veiculação de trucagem, montagem ou outro recurso de áudio ou vídeo que, de qualquer forma, degradem ou ridicularizem candidato, partido ou coligação”.
O Congresso em Foco entrou em contato com a parlamentar para que ela comentasse o fato de sua emenda ter sigo a gênese da restrição. Manuela, entretanto, não retornou o contato feito pela reportagem. Sua assessoria de imprensa também não comentou o assunto.
Fonte: Jornal Stylo, com informações do Congresso em Foco
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