segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Gentili: Proíbem humor porque político não quer concorrência


A mudança na lei eleitoral que prevê multa para quem "ridicularizar" candidatos é, para o humorista Danilo Gentili, uma questão de mercado. "Eles não querem concorrência", acusa. Uma resolução do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que vale para este pleito proíbe "produzir ou veicular programas" de TV e rádio que "degradem ou ridicularizem candidato, partido político ou coligação".

- É proibido o comediante ridicularizar os candidatos, mas liga no horário político e vê. Eu acho que eles tão falando que não querem concorrência.

Em entrevista a Terra Magazine, o integrante do CQC, da Band, conta que sempre se interessou por política. Apesar disso, ficou mais famoso no meio depois de embates diretos com deputados nos corredores de Brasília e por tratamentos nada receptivos em cidades do interior de São Paulo. Chegou a ser preso em Assis e em São Bernardo do Campo, quando também foi agredido por policiais.

- Eles querem bater para que eu não faça piada e eles querem censurar para que eu não faça piada. Mas eles podem fazer a merda que eles quiserem.

Para Gentili, porém, o humor na campanha está garantido. Senão pela mão dos comediantes, pela dos próprios candidatos. Ele elege o jingle da campanha do ex-presidente Fernando Collor para o governo do Alagoas como a maior piada das eleições até agora.

A música, que foi proibida pela Justiça Eleitoral, traz a frase "é Lula apoiando Collor, é Collor apoiando Dilma, pelos mais carentes".

- Se estão multando quem ridiculariza político, deveriam multar o cara que fez o jingle do Collor - dispara Gentili.

Leia a entrevista na íntegra.

Terra Magazine - O que você acha dessa restrição da lei eleitoral ao humor com os candidatos?
Danilo Gentili - Eu acho ridículo, não tem outra palavra. O humor é uma coisa, já falou o filósofo francês Bergson, o humor é 100% inteligência. Só a raça humana desfruta do humor. Nenhum animal desfruta do humor porque ele não tem o raciocínio. Então, a única raça na face da Terra que desfruta do humor é o ser humano. Então, quando eu vejo que o humor é uma dádiva do ser humano e a pessoa vem e quer tirar isso do ser humano, só me leva a crer que são pessoas que não tem inteligência, pessoas que não tem o mínimo de inteligência, o mínimo de raciocínio. Elas estão acostumadas a resolver problema com autoritarismo, com intimação, com medo. Agora, com inteligência e raciocínio, não é dessa forma que elas resolvem o problema. Prova disso é que estão privando o humano de desfrutar do humor.

Nesse seu raciocínio, então, é como se estivessem querendo transformar a gente em animal?
Exato. É um instinto animal de medo, de autoritarismo. Menos de raciocínio e de inteligência. É só com isso que o humor pode ser apreciado e feito.

Com isso, você e o CQC correm o risco de tomarem uma multa. Você tem se preocupado com isso nas entrevistas que você faz?
Tem duas coisas que o CQC sempre me fala desde o primeiro ano: "você não tem que se preocupar com multa, nem tem que se preocupar com audiência". Então, número é uma coisa que eu tenho carta branca pra não me preocupar no CQC. Quando eu estou na rua, eu não estou preocupado se vai ter multa, quantos zeros vai ter a multa. Eu vou e faço o melhor que eu posso. Depois eu levo o material para a edição e eles veem o que fazem com o material que eu trouxe.

Mas já aconteceu de alguma piada sua ter que ser cortada para evitar problema?

Esse ano não, até agora não. A eleição está começando, né? Mas tudo o que eu quiser falar sobre eleição, eu vou falar. Sobre o político que eu quiser. Porque no CQC eu sou só uma parte de uma linha de produção, eu sou o nó da corda, tem a edição, tem a direção, tem o departamento comercial, tem a Band, então tem muita responsabilidade. Mas se eu não falar o que eu quiser no CQC, eu tenho o meu show, eu tenho um palco, eu tenho a internet. Eu posso escrever um texto no meu blog, eu tenho um twitter. Então, uma coisa eu garanto, o que eu tiver vontade de falar, de me manifestar, eu não vou deixar de fazer piada com nada que eu ache que seja legal fazer piada. Mas essa é uma postura minha, não é do CQC, é minha.

O seu twitter, inclusive, já foi fonte de algumas boas polêmicas, não? Te incomoda isso?
Não. Eu tenho 800 mil seguidores. Eu faço uma piada e 790 mil pessoas que seguem pra ver a minha piada dão risada. As dez mil que seguem pra me encher o saco são as que causam polêmica. Eu nunca fiz polêmica no twitter, eu sempre fiz piada, mas sempre tem um chato que pega uma piada que eu faço e quer fazer polêmica com ela.

Você falou da mudança na lei ser um tipo de autoritarismo. O que é pior, ter uma lei que não te deixa fazer piada ou tomar porrada no seu trabalho como você já tomou algumas vezes?
Eu acho que as duas coisas fazem parte do mesmo sistema. Eles querem bater para que eu não faça piada e eles querem censurar para que eu não faça piada. E eles podem fazer a merda que eles quiserem. Vou dar um exemplo: esse jornalista da Istoé que gravou o Collor xingando todo mundo. O Collor ligou para o jornalista e xingou um monte o cara. Pelo amor de Deus, isso, em qualquer lugar do mundo onde se faz comédia, é um prato cheio. Mas o que é? Eu não posso fazer piada disso só porque o Collor é candidato? Na verdade, em qualquer lugar onde o sistema de democracia é mais desenvolvido e não é esse sistema provinciano que é aqui, o candidato vira mais vitrine do que nunca. Aqui, ele não é vitrine, aqui ele fica blindado. Então, o Collor pode ligar para um jornalista e dizer o que quer, isso vaza e eu não posso dizer nada. Como candidato, ele pode chamar o cara de filho da puta e eu, como comediante, não posso ridicularizar essa atitude dele que, por natureza, é ridícula.

E o que você ficou com vontade de falar para o Collor, então?
Eu não sei, eu posso sentar e pensar. Eu vou escrever um texto sobre isso. Se bobear, logo está na internet.

E você passou a se interessar por política fazendo o CQC ou você já costumava se envolver com isso antes?
De certa forma, é lógico que agora o meu envolvimento é maior. Antes, a minha posição com a informação política era de receptor. Eu sempre me interessei, eu lia revista, lia jornal, mas a minha posição era de receptor. Agora, além de receptor, é de passar. Eu tenho que passar informação, então a minha responsabilidade muda. Aí eu tenho que me informar mais ainda, tenho que saber mais ainda do que eu estou falando, pensar dez vezes antes de falar.

E você gosta disso?
Gosto. Eu gosto, eu acho que é uma ótima matéria para fazer piada. É uma das melhores.

A mudança na lei impede ridicularizar os candidatos, mas tem candidato que se ridiculariza, não é?
Exato. É proibido o comediante ridicularizar os candidatos, mas liga no horário político e vê. Eu acho que eles tão falando que não querem concorrência. "Não, não, ninguém vai fazer isso, a gente se esforça muito para fazer isso, vocês não podem." Eles só querem eliminar concorrência, querem o monopólio do mercado.

Qual é a maior piada dessa campanha até agora?
Tem algumas. Falam que têm direita e esquerda no Brasil, mas pra mim não tem nada, é só legenda que abriga cara que quer ficar rico e famoso. Para mim, uma das maiores piadas da eleição é o PT estar aliado ao Sarney, ao Collor. É o jingle do Collor! Essa é a maior piada que tem. Aquilo eu ouvi e dei risada. Aí, você vai no meio de petista, você pergunta o que está acontecendo e eles te batem. O maior problema é que você fala o que está acontecendo e eles não querem que ninguém fale o que está acontecendo. O jingle do Collor com Dilma e Lula pra mim é uma das maiores piadas de todas. Imagina você voltar no tempo 15 anos atrás e colocar esse jingle tocando. Todo mundo ia rir muito, iam falar que era coisa de comediante. Se estão multando gente que está ridicularizando político, tinham que multar o cara que fez o jingle do Collor.

Reportagem de Dayanne Souza - Terra Magazine
Fonte: Terra

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